Uso de fórmula infantil nas maternidades

Você já parou para pensar que as práticas adotadas nas maternidades podem influenciar o sucesso da amamentação? Pois é, um estudo americano, publicado agora em março de 2020, no respeitadíssimo periódico Pediatrics, mostrou que os recém-nascidos expostos ao uso de fórmula infantil, AINDA na maternidade, apresentam um risco de 2,5 a 6 vezes maior de desmame precoce. É muita coisa não?

Muitas vezes a fórmula infantil é oferecida aos recém-nascidos por diversos fatores, que vão desde as condições de saúde da mãe e/ou do bebê até as políticas hospitalares. O treinamento do pessoal e a disponibilidade da fórmula no hospital infelizmente influenciam a prática da complementação precoce.

      

A perda excessiva de peso pelo neonato é frequentemente indicada como um fator para complementação, porém, uma certa perda de peso é normal, pois é fisiológica. Muitos hospitais já tem como protocolo oferecer a fórmula caso o recém-nascido perca mais que 7%-10% do peso do nascimento. A perda excessiva de peso não é um marcador automático para a complementação, mas sim um indicador para uma avaliação do bebê.

Outras razões incluem hipoglicemia (diminuição da quantidade de açúcar no sangue) e hiperbilirrubinemia (acúmulo de bilirrubina no sangue, deixando a pele do bebê amarela). Essas condições podem ser prevenidas ou até mesmo tratadas com o correto manejo do aleitamento materno ou ingestão de leite obtido do banco de leite humano.

São raras as circunstâncias que requerem a complementação por fórmula na maternidade, como erros inatos do metabolismo do bebê ou terapia materna anterior à lactação (como a quimioterapia).       

Os resultados apresentados pelas pesquisadoras (Marcia Burton McCoy e Pamela Heggie) mostram que esse risco aumentado de desmame precoce, através da introdução de fórmulas infantis na maternidade, apresenta sérias implicações clínicas, já que a duração da amamentação tem impactos na saúde do bebê, o protegendo contra a síndrome da morte súbita, infecção e obesidade infantil, por exemplo.

As pesquisadoras propuseram um modelo no qual a complementação por fórmula infantil na maternidade afeta a amamentação: a fórmula infantil é oferecida em grande quantidade (superior à necessidade fisiológica), assim o bebê suga com menor frequência o seio da mãe, levando a uma menor diminuição da secreção do hormônio prolactina no organismo da mãe, e assim a uma diminuição da produção de leite. A diminuição da frequência e intensidade de amamentação leva a uma menor quantidade de leite removido, aumentando o risco de ingurgitamento mamário e regulação negativa da produção de leite. O famoso efeito bola de neve, já na maternidade!

Dependendo do método e da quantidade de fórmula administrada, o bebê pode ter dificuldade em se adaptar ao seio (você certamente já ouviu falar em confusão de bicos e talvez, de fluxo). Além disso, a complementação na maternidade frequentemente leva à complementação em casa, após a alta hospitalar. Quando se informa à mulher que o seu bebê “precisou” de complemento, as mulheres perdem a confiança na sua capacidade de produzir leite suficiente para o bebê. Além disso, a utilização da fórmula por profissionais da saúde passa a mensagem para as mães de que a fórmula é uma alternativa saudável. Algumas mulheres sentem que, uma vez que tenha sido introduzida a fórmula, a amamentação não será plena e que a amamentação exclusiva não será mais alcançada. Embora o leite de doadoras esteja normalmente acessível, a utilização da fórmula tem sido rotineira.

A promoção do aleitamento materno exclusivo já começa antes do parto. O apoio e incentivo dos médicos à amamentação são de extrema influência para as mulheres. Uma informação pré-natal abrangente sobre contato pele-a-pele, comportamento normal do recém-nascido e sinais de fome, ordenha manual e outras questões, podem ser relevantes para instrução da gestante. Essa educação deve se estender para os familiares que convivem com a mulher, com o intuito de formar a sua rede de apoio. Grupos de apoio à amamentação, curso de gestantes, apoio da doula e de uma consultora em amamentação aumentam a instrução pré-natal e as chances de sucesso pós-parto.

Os hospitais podem reduzir os índices de complementação por fórmula ao mudar seus protocolos e se aproximar dos 10 passos do Hospital Amigo da Criança. O contato pele-a-pele imediatamente após o parto e a amamentação na hora dourada (primeira hora de vida) reduzem significativamente o uso da complementação hospitalar, além de promover o aleitamento materno exclusivo à longo prazo.

O acompanhamento cuidadoso da mãe-bebê durante a estadia hospitalar determina se a complementação é realmente necessária. O próprio leite ordenhado da mãe pode ser usado para complementação. Na impossibilidade do leite materno, o leite de doadoras é preferível à fórmula, ao proteger o sistema digestivo ainda vulnerável do neonato, reforçando a importância do leite materno e o caráter temporário da complementação.

Quando necessária, a complementação deve ser feita em volumes fisiológicos e combinada com práticas para proteção do aleitamento materno, como a ordenha do leite para manutenção da produção. A atenção deve continuar após a alta hospitalar, especialmente para as famílias que receberam complementação. As famílias devem ter um plano de ação para aumento da produção de leite e diminuição/eliminação da fórmula infantil. O acompanhamento de uma consultora de amamentação deve ser feito até que se eliminem as dificuldades encontradas no aleitamento materno.    

A preparação da equipe de saúde e a inclusão do profissional do aleitamento materno na rotina de cuidados à dupla mãe-bebê são essenciais para redução do uso de fórmulas nas maternidades e ajudam a garantir o sucesso da amamentação.

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Tradução e adaptação do artigo: McCoy MB and Heggie P. In-Hospital Formula Feeding and Breastfeeding Duration. Pediatrics. 2020; 146(1):e20192946).        

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